quinta-feira, 10 de setembro de 2020

Lição 4 - Parte 1

 


 


DAS ORIGENS, DOS NÚMEROS E DAQUILO QUE REALMENTE IMPORTA NA VIDA…


*Não deixe de ler a introdução desta lição 4 na postagem anterior! ;)


Uma importante questão que abre este capítulo e que já tinha sido apresentada no capítulo precedente do livro, diz respeito a uma importante característica do principezinho: Ele é um extraterrestre!

Isso poderia ter muitos significados, mas eu gosto de pensar em dois em especial: o fato de que a pureza, a doçura e a inocência do pequeno príncipe são algo literalmente de outro mundo, algo raro, sutil, que não se vê por aí... Seu jeito especial, sua graça e sensibilidade, são tão raras em nosso mundo que não restou alternativa ao autor que não a de colocar sua origem em outras esferas....

O segundo significado, que já tinha sido esboçado na análise dos primeiros capítulos, é a hipótese de ser o pequeno príncipe um reflexo, ou uma projeção da Alma e psique de Antoine de Saint-Exupéry, e que ele magistralmente personificou no principezinho. 

E assim, o fato dele ser um extraterrestre poderia ser melhor entendido se lembrarmos algo que o grande psicólogo suíço C.G. Jung dizia a respeito da aparição de óvnis e casos semelhantes. Para Jung, essas aparições e as questões relacionadas eram possivelmente uma manifestação profunda do inconsciente coletivo, que diante de uma realidade difícil, projetava no céu figuras circulares, esféricas e ordeiras, que transmitiriam mensagem de uma “ordem superior”. 

Tal como a improvável e repentina aparição de nosso principezinho no meio do deserto do Saara, essas aparições espetaculares de extraterrestres no céu, segundo Jung, refletem a mentalidade daqueles que as observaram, a sua busca por ordem e sentido naquela fase de suas vidas. O príncipe, e sua candura, seriam o retrato anímico daquela fase da vida de Antoine... 

Agora falando diretamente sobre o enredo deste quarto capítulo, o autor de forma bastante incisiva renova suas críticas aos padrões ocidentais, e talvez de um modo mais francamente sociológico.

Ao narrar como o asteróide de origem do pequeno príncipe foi descoberto por um astrônomo turco, ele enfatiza o fato de que ele recebeu nenhum crédito por sua descoberta apenas por causa das roupas típicas que usava! E que ao trocar suas roupas por outras à moda ocidental, graças à interferência de um ditador turco que obrigou as pessoas a abandonarem suas roupas de origem para copiarem europeus (outra crítica velada, mas incisiva ao colonialismo europeu) finalmente foi levado à sério em sua descoberta: “As pessoas grandes são assim” diz o autor no livro...E veja que estamos falando de uma crítica à ostentação ocidental feita ainda nos começos do século passado, quando nem mesmo se sonhava com o mundo da ostentação máxima em redes sociais, instagram, facebook, etc...

Reforçando ainda mais essas críticas, Logo em seguida, Antoine faz uma nova crítica social que ainda permanece atual hoje em dia, ao nosso materialismo e apego a superficialidade, algo que segundo ele se traduz pelo nosso amor aos números:  

“As pessoas grandes adoram os números. Quando a gente lhes fala de um novo amigo, elas jamais se informam do essencial. Não perguntam nunca: "Qual é o som da sua voz? Quais os brinquedos que prefere? Será que coleciona borboletas?" Mas perguntam: "Qual é sua idade? Quantos irmãos ele tem? Quanto pesa? Quanto ganha seu pai?" Somente então é que elas julgam conhecê-lo. Se dizemos às pessoas grandes: "Vi uma bela casa de tijolos cor-de-rosa, gerânios na janela, pombas no telhado..." elas não conseguem, de modo nenhum, fazer uma ideia da casa. É preciso dizer-lhes: "Vi uma casa de seiscentos contos". Então elas exclamam: "Que beleza!"

E por falar em números, se voltarmos ao exemplo da ostentação nas redes sociais, hoje em dia uma pessoa se torna celebridade pelo número de seguidores que ela tem nestas redes. Falamos então que esta pessoa se tornou uma “influencer” pois tem milhares de seguidores no instagram, e isso virou até manchete: "A atriz tal, que é namorada de jogador tal, atingiu a marca de tantos milhões de seguidores!” E essa notícia vira então destaque! Uau, ela tem milhões de seguidores, deve ser alguém importante né??

E assim vai… Não há nada de intrinsecamente errado nisso, não acredito que Antoine fazia um julgamento moral quando falou dos números e da casa, no trecho acima. E tampouco nós aqui criticamos "influencer" e as pessoas que gostam deles.

É uma realidade atual, e se isso ocorre assim é porque é deste modo que se distribuem os afetos atuais, e é essa distribuição de afetos esquisita, essa valorização do que talvez não merecesse tanto valor, que se critica aqui e no livro, e não as pessoas: por que nós valorizamos números e atributos objetivos como beleza e posses e não atributos subjetivos como a generosidade, o altruísmo, o jeito de ser? Por que damos destaque à roupa ou ao novo carro da celebridade e não aplaudimos o bombeiro que salva as florestas das chamas, ou o gari que sob sol, chuva (e pandemia) trabalha para deixar nossas ruas limpas? Quem são essas celebridades anônimas? Quantos seguidores elas têm?

Como falei acima na postagem de introdução deste capítulo, foi uma coincidência oportuna este capítulo estar sendo publicado durante a pandemia, pois a crítica ao mesmo sutil e cáustica de Antoine soa muito atual, algo que ficará ainda mais destacado no próximo capítulo.

Pois somente agora, que nos vemos diante de uma pandemia, quando o planeta nos obriga na marra a valorizarmos aquilo que é essencial. Só agora, quando fomos obrigados, enxergamos e valorizamos aquilo que se considera serviço essencial: Enfermeiros, médicos, entregadores, motoristas, frentistas, veterinários, faxineiros, porteiros, e muitos e muitos outros profissionais, que hoje estão ali na linha de frente, literalmente arriscando suas vidas para NOS SERVIR, de maneira abnegada e corajosa, e que somente agora aprendemos a dar o devido valor: foi necessária uma pandemia global para descobrirmos que os milhões pagos ao jogador de futebol não têm o mesmo valor real que o trabalho de um enfermeiro, que recebe poucas centenas de reais…

Não precisamos nos alongar mais nesta reflexão, pois acho que a mensagem aqui já ficou bem clara, e como falamos, a realidade está se impondo…

Para finalizar esta 1ª parte, não deixa der ser incrível notar que uma das mais famosas frases do pequeno príncipe trata exatamente deste tema da essencialidade (frase esta que será objeto de um profundo estudo mais adiante quando chegarmos no seu capítulo próprio). Extrapolando propositadamente o significado original que Antoine deu à frase, mas sendo fiel a sua crítica social já que no trecho acima ele também fala do essencial, podemos nos adiantar um pouco na análise desta famosa frase e pensar se O ESSENCIAL QUE É INVISÍVEL AOS OLHOS não se aplica também àquilo que nós não sabemos valorizar devidamente.

Quais pessoas, quais profissões, quais lugares que antes eram invisíveis para nós agora, por causa da pandemia e seus perigos, não readquiriram significados? Quais lugares que antes não valorizamos e que deixamos se tornarem invisíveis pelo hábito ou por qualquer outro motivo, que agora, por conta quarentena readquiriram tanto valor? 

Para exemplificar rapidamente, a praia, este lugar comum e banalizado do Brasil nunca foi tão ardentemente desejado, nunca sentimos tanta falta do mar, que apesar de estar tão perto para alguns, nunca esteve tão longe agora, que somos proibidos de chegar perto dele… Claro que o mesmo vale para outros lugares onde as restrições da pandemia nos impediram de ir... Quais parques, lagoas, bibliotecas, lojas, que antes você, pelo hábito ou comodismo achava que estariam ali para sempre te esperando agora você não poderá mais vê-los?

Será que estes lugares então invisíveis pelo tédio agora serão vistos com novos olhos renovados pela ausência e saudades?


****Continua na parte 2, que será postada aqui no Sábado, dia 12. Até lá!

Por Daniel Antoine Jaoude
contato: danieljaoude@hotmail.com

https://www.facebook.com/Ensinamentos.do.Pequeno.Principe


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